Zeferino Ribeiro de Sousa
Dados pessoais, infância, escolaridade
Chamo-me Zeferino Ribeiro de Sousa, nasci em Outeiro, Galegos, Penafiel, em
1949. Os meus pais também são de Penafiel, não têm qualquer escolaridade e
sempre trabalharam no campo. Era uma vida muito instável, muitas vezes era
preciso dinheiro para levar os meninos ao médico e não havia. O que
tínhamos para comer era um pão e um caldo, com umas couvinhas a dançar
na água com um bocadinho de farinha. A terra dava centeio, milho, feijão, mas
dava pouca batata.
Mesmo assim a gente divertia-se muito a brincar na rua, descalços, a jogar a
bola, que era feita de uma meia cheia de papel. Às vezes arrancávamos botões
da roupa para jogar ao botão.
Eu fiz a 4ª classe. Da escola lembro-me dos livros de leitura, de história de
Portugal, de matemática... Os professores eram muito rígidos, batiam com uma
régua de madeira sempre que fazíamos um erro, era uma disciplina muito
grande. Enquanto andava na escola já tinha de ir trabalhar. Eu aos 5 anos já
andava a chamar os bois no meio do campo e tinha de amanhar a terra.
Trabalhávamos a terra antes e depois da escola, até à noite.
Actividade Profissional
Acabei a 4ª classe aos 11 anos e depois continuei a trabalhar na terra até aos
16, 17 anos. Depois fui para uma pedreira marrear a pedra, que era ralar a
pedra com uma marreta para ir para uma britadeira, fazer brita.
Aos 18 anos concorri para jardineiro da Câmara do Porto e fiquei, porque tinha
experiência da lavoura. Fui para lá como ajudante de jardineiro, comecei logo a
ganhar 980$ por mês, mas dava-o todo ao meu pai. Continuei a morar em
Penafiel: vinha todos os dias de bicicleta de casa até à estação de Cête e
chegava ao Porto de comboio. De São Bento ao Palácio vinha a pé. Ia todos os
dias almoçar à Legião Portuguesa na Rua do Pombal, por 15 tostões ou 2$.
Aos 20 anos casei. Naquela altura usava-se oferecer um esmalte de pôr ao
peito com a fotografia, e não um anel de noivado. Como todo o dinheiro que eu
ganhava era dado aos meus pais, tive de lhes pedir algum para poder comprar
um esmalte. Eles recusaram-se e foram sempre contra a minha vontade de
casamento. Os pais dela aceitaram mas os meus não. Isto porque a nossa
família, mesmo sendo pobre, sempre ia tendo mais algumas posses que a
família dela. Ainda não tinha 21 anos e precisava da autorização deles.
Entretanto o padre ajudou-me e acabei por fugir de casa e casar às
escondidas. Fiquei a viver com os meus sogros. Depois os problemas foram
ultrapassados e voltei a falar com os meus pais. A minha esposa foi sempre
doméstica, dedicou a sua vida a tratar dos filhos, a ajudar os pais a trabalhar
na terra. Agora olha pelos netos, trata-me de uns terrenozitos e faz a vida de
casa.
Antigamente a Feira Popular era aqui no Palácio. Ainda bem que já acabou
porque destruía tudo, estragava tudo. O Pavilhão era mais utilizado para
exposições e espectáculos da Feira Popular. Lembro-me também do Jardim Zoológico, no qual fui tratador dos animais durante 12 anos. Concorria sempre
como jardineiro mas depois trabalhava como tratador de animais. Tratei do
leão, do chimpanzé, dos macacos, dos cães, de duas burras, dos veados, dos
chibos bravos... Tinha de lavar as jaulas, fazer a limpeza e dar-lhes de comer.
Depois os animais lá foram morrendo lentamente, e hoje é mais bonito ver
estes animais à solta. Nessa altura ganhava 1165$. Sempre que se subia de
categoria, o salário aumentava 100$.
Tinha direito a baixa paga mas só passado 3 anos de trabalho. E tínhamos a
Caixa do Estado, depois veio a caixa da ADSE, que é a que temos agora. Não
havia subsídio de alimentação mas parece que já havia subsídio de Natal.
Trabalhava 9 horas por dia e folgava só a partir do meio-dia e meia de sábado.
Após uns largos anos a trabalhar como jardineiro cá no Palácio, desenvolvi
mais os meus conhecimentos a trabalhar, nas minhas horas vagas, num horto.
Fui um dos fundadores do Horto Vilar d`Além, em Gondomar e aí comecei a
conhecer melhor os próprios nomes científicos das plantas. Trabalhei lá
durante 10 anos.
Hoje sou encarregado no Palácio e tenho 12 funcionários sob a minha alçada.
Eu já não sou obrigado a fazer nada, o meu cargo é só dirigir os serviços, mas
todos os dias mudo de roupa e vou para o meio dos funcionários ensinar como
se faz o serviço, fazê-lo se for preciso. Tratamos das limpezas, podas,
repicações, alporques, enxertias, mergulhias, sementeiras, plantações, tudo
isso.
Tenho 2 filhos. O meu filho saiu da escola aos 12 anos, com o 6º ano, não quis
estudar mais e foi logo para trolha. Depois foi trabalhar, também como trolha,
para perto da Fábrica Eduardo e Ferreirinha. Hoje é funcionário como eu, aqui
no Palácio, já há 12 anos, como encarregado da manutenção. A minha filha
também fez a 6ª classe, também não quis estudar, foi com 12 anos para uma
confecção aprender costura, onde continua a trabalhar.
Actividade Associativa
Sou sócio de uma associação em Penafiel que se chama Os Amigos da Paródia. Tem uma sede onde se joga, se faz uns concursos de cartas de
malhas, temos um bar, temos um rancho folclórico, uns "Zés Pereiras" de
bombos, uma equipa de futebol, amadora... Só os homens podem ser sócios,
as mulheres não. Também temos uns passeios que é só para homens. O bar
pode ser frequentado por mulheres e também podem participar nos torneios,
mas há actividades que são só para homens.
A festa mais rija na freguesia é o São Pedro. Faz-se uma procissão de velas
muito grande por 2 Km. Depois, junto à capela, que é no meio do monte, há um
campo de futebol onde se faz um arraial à noite. Dura até de manhã e depois
há missa de festa, e à tarde uma nova procissão à volta da capela, para fazer a
benção dos campos, para as boas colheitas.
Actividade Social e Política
Os funcionários da Câmara recebiam todos, por alturas das eleições, uma carta
onde tínhamos de fazer uma cruz e entregar. Era o nosso voto, não nos
podíamos recusar senão poderia dar expulsão do serviço.
Depois do 25 de Abril, o Pavilhão Rosa Mota começou a ser muito utilizado
para congressos políticos. Lembro-me de vários, mas o 1º congresso que
tivemos foi o do CDS. Isto teve de ser tudo cercado pela polícia, fui preciso até
vir a Guarda Republicana a cavalo para os militantes do CDS saírem. Chegou
a vir um helicóptero com paraquedistas e forças militares. Ficámos aqui retidos
durante toda a noite porque á fora a oposição tinha cercado o Palácio, não
queriam o partido de direita.
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